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Aprendizagem por pares em projeto audiovisual

Aprendizagem por pares em projeto audiovisual
Andressa Caprecci
jun. 7 - 8 min de leitura
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O ano de 2020 chegou tímido. Nos primeiros meses pude pisar no chão da minha escola todos os dias, de segunda a sexta. No início de março, aquele momento em que eu começava a sentir que o novo ano letivo estava se transformando em mais um ano letivo, fui e fomos atravessadas por um turbilhão de sentimentos e desafios nunca antes imaginados. 

Como educadora de Tecnologias Educacionais fui bastante requisitada para pensar sobre as questões operacionais das ferramentas tecnológicas que seriam fundamentais para a manutenção do afeto escolar.

O primeiro semestre do ensino remoto foi de adaptação, percebi que meu papel na escola havia se modificado, devido a muitas demandas técnicas, tive cada vez menos tempo para desenvolver as atividades pedagógicas.

Nas férias de julho me reorganizei, e a partir da volta pude atuar com força em parcerias com as professoras de sala.

Em meados de agosto, uma educadora do 5º ano me convidou para um projeto. O quinto ano estava trabalhando com contos etiológicos, e a equipe de T.E. entraria para desenvolver, junto às turmas, vídeos. No ano de 2019, eu já havia desenvolvido vídeos com o 5° ano, mas dessa vez uma professora havia me pedido para falar sobre a edição aos alunos e alunas.

Durante esses anos de docência sempre trabalhei com audiovisual, realizando a pré-produção e produção, e introduzindo o conceito de edição, no entanto a execução desse processo nunca era realizada pelos estudantes.

Em um mundo pré-pandemia, meus alunos de nove a onze anos ainda não tinham muito domínio tecnológico e a edição era um espaço inexplorado em minhas aulas.

Essa demanda me fez refletir muito sobre como eu iria conduzir. A professora gostaria que eu trouxesse o desafio, mas uma de minhas angústias se relacionavam com o fato de que não tínhamos uma assinatura de editor de vídeo.

Da desconstrução à reconstrução

Nesse momento pesquisei, conversei com a minha equipe, com outras áreas da escola, com as professoras e com a coordenação pedagógica. Além disso, voltei às expectativas de aprendizagem do Currículo da Cidade - Tecnologias para aprendizagem, que usamos como uma ferramenta norteadora e tive uma ideia.

Primeiramente, fiz um convite à minha irmã Maria Julia Caprecci, que é editora profissional de vídeos, para que conduzisse um encontro falando sobre o conceito de edição. Eu sabia que aquele corpo feminino, falando sobre uma área tão masculina, traria discussões importantes aos grupos. Enquanto organizava esses encontros, criei um questionário para mapear quantas crianças sabiam editar e quem estava disposto a ensinar aos colegas. Das quatro turmas, três delas tiveram pelo menos três inscrições. Em uma das turmas, nenhuma das crianças sabiam, então eu preparei uma oficina sobre um editor gratuito.

Durante uma semana criei uma agenda de encontros com os oficineiros e oficineiras. Nestes encontros, individuais ou em grupo, eu orientava a construção de uma oficina, como conduzir, o que selecionar, como montar um material de apoio.

Esses encontros foram muito importantes para nos aproximarmos, criarmos vínculos e construir uma rede de referência para o restante da turma. 

Quando fiz a escolha pela aprendizagem por pares, me abri para aprender ainda mais com os estudantes envolvidos. Paulo, um oficineiro que se voluntariou de pronto, trouxe a ferramenta Power Point. A princípio não compreendi o motivo dele entender a ferramenta como um editor de vídeo, pedi que me explicasse em detalhes como usaria. Paulo começou a me contar que seu pai trabalha com a ferramenta e que ele faz transições de slide automática, insere vídeos, sons e imagens. E que a partir dessa construção, era possível gravar a tela com o programa Loom e teríamos um vídeo. Então, fui ajudando Paulo a construir seu planejamento da oficina, criar um Power Point ensinando os comandos e montar seu roteiro de aula. E hoje percebo que essa experiência com Paulo só foi possível, pois eu estava ali, disposta a ensinar e aprender com meus alunos da 5ª série.

A maior parte das crianças trouxeram editores de celular, alguns, inclusive, tinham marca d’água, mas no momento em que decidi mudar o paradigma do processo, ouvi-los e dar o espaço para essa aprendizagem por pares, escolhi também ser menos preciosista com a qualidade técnica.

Compartilhando experiências

Olhos atentos à telinha, risadas, perguntas, sugestões, empolgação e empenho dos oficineiros e oficineiras. A experiência pedagógica superou minhas expectativas. Aqueles encontros construídos por dias de preparação foram importantes espaços de troca e de afeto, em um ano em que as relações escolares estavam tão abaladas.

Cada formador teve cerca de quinze minutos para mostrar ao grupo o que haviam preparado. Algumas haviam escolhido compartilhar a tela e mostrar as instruções, outros haviam preparado prints dos editores.

Paulo apresentou o PowerPoint que havia preparado, Jaqueline compartilhou a tela de seu celular e editou ao vivo um vídeo com os colegas, mostrando os comandos e experimentando botões inexplorados.  

Colocando a mão na massa

Alimentados por esses novos conhecimentos, os grupos tiveram encontros para editarem os vídeos. Algumas crianças se responsabilizaram mais pelas edições, principalmente os oficineiros e oficineiras.

Os amigos de Paulo acataram a ideia do Power Point e do Loom. Construíram uma apresentação com imagens retiradas da internet e balões de fala. Depois de pronto, em uma chama de vídeo pelo Google Meet, começaram a gravar a tela, habilitaram o microfone e iniciaram a apresentação. À medida que os slides mudavam automaticamente, narravam a história.

Todos os grupos realizaram as edições com os programas que aprenderam. Inclusive a turma em que nenhuma criança sabia editar, nesse caso utilizando o Clipchamp, o editor que eu havia recomendado e ensinado.

Olhando para trás 

Após a finalização dos vídeos, tivemos um encontro para assisti-los. Mais uma vez, notei a empolgação e satisfação presentes no grupo. Vale ressaltar que embora eu soubesse que não haveria uma qualidade técnica elevada,  fizemos um momento de revisão estética sobre os produtos. Todos os grupos puderam falar sobre os vídeos dos colegas, de maneira respeitosa. Muitos elogios e algumas dicas para melhorar o produto surgiram.

Nesse momento também, fizemos uma avaliação da nossa jornada, buscando identificar nossos desafios e aprendizados.

Olhando para frente

Minha paixão por produção audiovisual é antiga, e logo em meu primeiro ano no colégio criei uma mostra de produções realizadas por nossos estudantes no âmbito escolar. As exibições nessa época eram realizadas durante o recreio, em uma sala escura com todas as crianças sem máscara. Cada vez que viam uma produção passando no projetor vibravam e contavam aos colegas como haviam participado.

Em 2020 a quantidade de produções foi um pouco menor, mas a necessidade de acessar trabalhos da escola em casa crescia. Então, senti a necessidade de criar um espaço para compartilhar as produções que havíamos construído com os quintos anos e tantas outras que fizemos. Como em minha equipe temos o hábito de documentar todos os nossos planejamentos, percursos e produtos, revisitei todos os trabalhos que produzimos ao longo de minha atuação, e com a ajuda da Pamela dos Reis, estagiária de Educomunicação recém contratada na época, montamos um site para abrigar esses vídeos e compartilhar com as famílias, sendo um acervo permanente para nossa comunidade.

Um dos desafios do cotidiano escolar é documentar e compartilhar, mas é por conta desses hábitos que podemos trocar, registrar e enriquecer nossas práticas.

 

*Observação: Paulo e Jaqueline são nomes fictícios. 

 


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