Um tema bastante discutido nos estudos da Educação diz respeito à aprendizagem significativa, aquela que se incorpora à vida do educando trazendo um significado para além da memorização de conteúdos avaliados por uma prova.
É comum ouvir relatos de alunos que esquecem o conteúdo imediatamente após a semana de provas, nós educadores provavelmente vivenciamos isso na época de estudantes e vestibulares. Fica claro, nestes casos, a ausência de significado destes conceitos para vida do sujeito.
Quando olho para a minha formação acadêmica, consigo identificar conteúdos, professores e encontros que de fato foram significativos. Porém, como educomunicador, é um desafio planejar práticas educativas que se tornem experiências significativas para os meus alunos e alunas.
Neste texto, faço uma reflexão (talvez uma divagação) sobre o que torna significativa uma prática pedagógica, no sentido de preparar o indivíduo com conhecimentos teóricos e práticos para a vida. Penso que experiências formativas são significativas quando efetivamente promovem a aprendizagem, visto que esse é objetivo principal das práticas educacionais.
Assim, o foco da análise será nas experiências formativas significativas na área da Educação. Para este texto, selecionei alguns autores da Pedagogia para contribuírem nesta discussão, como Guimarães (1982), Meirieu (1998) e Lahire (2004), além de Paulo Freire (2018) que sempre é uma referência bem vinda.
Ensinando a pensar, não a memorizar
Na leitura do texto de Guimarães (1982) “A disciplina no processo de ensino-aprendizagem”, encontramos que uma prática que promove o aprendizado é aquela que promove a compreensão de determinada matéria (por exemplo, as áreas de conhecimento na Educação) em sua totalidade, não de forma fragmentária. Isso só é possível se houver a assimilação pela consciência da organização lógica desta determinada matéria.
Assim, descartamos como uma experiência formativa significativa aquelas que objetivam a memorização de informações, sem trabalhar a organização lógica do pensamento e das relações. Na minha experiência como aluno encontro diversos exemplos em que a abordagem dos professores se resumiu a passar informações e cobrar definições conceituais na prova, para as quais a preparação pessoal se baseava mais na memória do que em raciocínio.
De acordo com Guimarães (1982), esta compreensão só é possível quando o aluno experimenta o obstáculo que implica em dificuldades para o entendimento. Em uma experiência formativa significativa, o professor planeja e determina este processo, selecionando os obstáculos com os quais os alunos irão se deparar.
No texto de Meirieu (1998), de maneira semelhante, o autor enfatiza a necessidade do conflito para que o aluno possa aprofundar um determinado conceito, gerando um “desequilíbrio” que necessita uma reelaboração da representação conceitual. O obstáculo causa uma ruptura que leva a uma estabilização do conhecimento em um nível superior, mais aprofundado.
Vemos que outra questão relevante para uma experiência formativa significativa é ser desafiadora para o aluno, necessita de dedicação e superação de obstáculos. Em outras palavras, interpreto que é indispensável que o processo educativo tenha o aluno como sujeito, com participação ativa em seu aprendizado. A questão inerente é como atingir este grau de participação sem a sensação única de “obrigação”, trazendo interesse pela aprendizagem.
Sala de aula conectada com o mundo
Meirieu (1998) aponta que os processos mentais do ser humano apenas consolidam o significado de conceitos quando a identificação e a utilização dos mesmos ocorrem de maneira simultânea e ativa. O autor propõe que as experiências formativas sejam planejadas para que os alunos construam os conceitos por meio da interação entre informações e um projeto com significado pessoal para o sujeito.
Dessa forma, o aprendizado faz sentido a partir da sua aplicação na realidade do aluno e torna-se uma motivação encontrar respostas para as situações propostas pelo professor. A mediação entre sujeito e mundo seria o artifício didático para desenvolver nos alunos a capacidade de aprendizagem “espontânea”, com maior apropriação do processo de aprendizagem por parte do aluno.
Autonomia e disciplina não deveriam ser sinônimo de submissão e obediência
Coloco a autonomia como o principal objetivo da Educação. Deixo claro que falo de uma autonomia com interpretação crítica do mundo, de seu contexto histórico-cultural, com a valorização do desenvolvimento da curiosidade e da criatividade, de uma maneira humanizada e solidária. Uma visão freireana da autonomia. A experiência formativa significativa deve, não apenas apresentar esta autonomia ideal, mas ter na sua prática (atuação docente) estes valores, reproduzindo de maneira genuína e intencional.
No livro de Lahire (2004) “Sucesso escolar nos meios populares”, o autor fala no capítulo 2 sobre a autonomia do aluno como um fator determinante de “sucesso” ou “fracasso” escolar. Porém, ele critica o significado de autonomia para a comunidade escolar como sinônimo de autodisciplina, de saber seguir instruções sozinho, de obediência. Porém, esta autonomia, diferente da proposta por Paulo Freire (2018) em “Pedagogia da Autonomia”, está relacionada a uma visão de aluno como objeto do processo educativo, atuando de maneira passiva para “receber “ os conhecimentos e instruções do professor de maneira obediente.
Voltando ao texto de Guimarães (1982) que coloca o processo de aprendizagem com um disciplinar-se e afirma que o objetivo da disciplina é compreender as exigências da matéria, de modo a aproximar o sujeito da liberdade. Com o conhecimento específico sobre as matérias (escolares ou não) podemos atuar de maneira mais efetiva para a sua transformação. O próprio conceito de disciplina para o autor se distancia do significado comumente aplicado como sinônimo de obediência ou submissão. Aproximando-o do conceito de liberdade.
Como dar significado às práticas pedagógicas?
Para concluir esta reflexão, vejo as experiências formativas significativas (no contexto da Educação) aquelas que objetivam a autonomia como liberdade crítica sobre o mundo. Entendo ser necessário um processo educativo que realize a mediação entre o aluno e o mundo, bem como entre a teoria (informações) e a prática (projetos e ações), que vá além da memorização fragmentada de conceitos e propicie o entendimento do pensamento, do aprender, relacionados à compreensão da organização lógica dentro das áreas de conhecimento.
O aluno deve ser sujeito com participação ativa no processo sendo desafiado e desafiando-se a aprender. Cabe a nós, educadores, planejar nossas atividades pedagógicas com ênfase neste processo de conscientização, de desenvolvimento do pensamento e de valorização do estudante como sujeito.
Referências bibliográficas
GUIMARÃES, Carlos Eduardo. A disciplina no processo ensino-aprendizagem. Didática, São Paulo, 1982.
LAHIRE, Bernard. Sucesso escolar nos meios populares. As razões do improvável. 1ª edição, 2ª impressão. São Paulo: Editora Ática, 2004
MEIRIEU, Philippe Aprender …. sim, mas como?. Porto Alegre: Artmed, 1998, cap. 2 – “O que é aprender?”.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 57a ed. São Paulo: Paz e Terra, 2018.
Este texto foi publicado originalmente no blog da Layers Education